Os suspeitos cúmplices do assassino da jornalista Anna Politkovskaia foram absolvidos. O caso regressa à Comissão de Investigações da Procuradoria, as procuradoras que tiveram a seu cargo a acusação afirmam que vão apelar. A posição da parte lesada, as advogadas dos filhos da jornalista, por seu lado, é de que não vale a pena recorrer. Aparentemente voltou-se à estaca zero. No entanto, a “Novaia Gazeta” tem procurado fazer também as suas investigações, que parecem não andar muito longe da versão dos investigadores oficiais. Queria referir aqui alguns pontos da versão divulgada pela jornalista Iúlia Latinina e das perguntas que esta considera fundamentais, e que ainda estão em aberto. Como já tinha dito o redactor chefe da Novaia Gazeta, Serguei Sokolov, no dia em que os jurados emitiram o veredicto, na versão dos colegas e familiares de Anna Politkovakaia, os réus que foram a tribunal estão de facto relacionados com o crime, e a sua culpa não foi provada porque a acusação trabalhou mal. Segundo Iúlia Latinina, há ainda a ter em conta o trabalho do advogado de defesa, Murad Mussaev que, segundo a jornalista, é actualmente um dos melhores advogados russos e que soube “trabalhar para os jurados”, desmontando as provas que a acusação apresentou. No entanto, sempre segundo Iúlia Latinina, isso não exclui que os réus tenham mentido. Latinina considera que o processo foi levado ao tribunal “aos bocados”, com falta de ligações lógicas, o que acabou por tirar credibilidade à acusação. Na opinião da jornalista, como já tinha sido dito outras vezes, o enredo do caso leva a ligações “curiosas” entre forças da ordem e grupos criminosos (máfias). Como já tinha dito Sokolov, também Latinina considera que as testemunhas podem actualmente estar em risco.
Lacunas na investigação
O crime apresentava um certo “à vontade” dos executores. Foi utilizado o carro dos irmãos Makhmudov (que eles negaram ter, depois admitiram). O blusão que endossava o suspeito executor, Rustam Makhmudov, era o seu. Dois dias depois da morte de Anna Politkovskaia, ele teria sido identificado, mas a informação só chegou à Comissão de Investigação da Procuradoria meio ano depois. Entretanto, Rustam Makhmudov, no dia a seguir ao dia em que tinha sido identificado, consegue um passaporte falso e sai da Rússia.
De acordo com o raciocínio de Iúlia Latiniana, os organizadores do crime e os que o encomendaram, “estavam muito perto uns dos outros”, não havia uma longa cadeia para chegar ao “encomendador”, e “quando ficou claro quem era o que tinha encomendado, retiraram os organizadores do caso”. O que levou a que no tribunal só tenham aparecido uma parte das peças que compunham o mosaico do crime, e por isso a acusação se apresentava inconsistente. Uma das críticas de Iúlia Latinina vai para o facto de ter sido ilibado Chamil Buraev, ex-presidente da câmara de cidade chechena de Atchkhoi-Martan (Chechénia), que chegou a ser detido numa fase precedente das investigações. “No dia do assassínio, Serguei Khadjikurbanov (acusado de ser o organizador do crime) telefonou várias vezes a Chamil Buraev e ao seu motorista Iakhei”, diz Latinina e pergunta porque é que não se verificou a quem Buraev telefonou ainda nesse dia? Segundo a jornalista, o investigador principal do caso, Piotr Garibian, “sabe provavelmente a resposta”. Pergunta também porque é que um personagem como Lom-Ali Gaitukaev (segundo a versão da Novaia Gazeta, o organizador inicial do crime era ele, só que foi preso no verão de 2006, antes do assassínio de Politkovakaia) não foi incriminado no caso. Segundo a versão da Novaia Gazeta, a “encomenda” teria sido feita a Chamil Buraev e transmitida por este a Gaitukaev, que entretanto foi preso por outra tentativa de homicídio, e o passou a Khadjikurbanov. Resulta dos contactos entre os vários personagens um “terrível novelo de polícias e bandidos”. Sabia-se que há quem tivesse andado a seguir Anna Politkovskaia poucos dias antes do assassinato. Segundo a Novaia Gazeta, as pistas levam a uma espécie de agência de detectives, que continua a oferecer os seus serviços na internet, mas que foram ignorados no processo. Entre as pessoas que andaram a seguir Politkovakaia, aparece um ex alto oficial da polícia, Dmitri Pavliuchenkov. Do seu telefone resulta que provavelmente a encomenda de seguir Politkovskaia teria sido feita por um grupo criminoso. Outro dado curioso, é que o suspeito executor, Rustam Makhmudov, tinha um mandado de captura pendente desde 1997, mas “isso não impediu que ele fosse com o tenente-coronel do FSB, Pavel Riaguzov, (suspeito de ter fornecido o endereço de Anna Politkovakaia), com um passaporte falso, à cidade de Rostov, reconhecer um checheno”.
As provas que havia contra os outros dois irmãos Makhmudov, Ibraguim e Djabrail, era que eles tinham telefonado um ao outro, antes e depois do assassinato de Anna Politkovskaia, muito perto do local do crime. As justificações destes foram sempre do tipo, “não me consigo lembrar”. O que é que eles estiveram a fazer hora e meia na rua Lesnaia (onde morava e foi morta Anna Porlitkovakaia) eles não explicaram.
Latinina refere ainda uma viagem conjunta de Gaitukaev, Buraev, Riaguzov e Sliussar (chefe do departamento do FSB onde Riaguzov trabalhava) a Nazran (captial da Inguchétia), assim como um encontro num restaurante, no verão de 2006, dos mesmos quatro personagens com ainda um certo Alikhan Mutsaev.
Iúlia Latinina afirma que seria fácil preencher os “buracos” do caso Politkovakaia, respondendo a algumas perguntas. “Se amanhã, o presidente Medvedev ou o primeiro-ministro Putin chamassem o investigador Garibian e lhe perguntassem duas coisas (primeira pergunta: quem é o tal Mutsaev, que se encontrou com o bandido Gaitukaev, com os elementos do FSB no restaurante? A segunda pergunta: a quem telefonou Chamil Buraev, no dia 7 de Outubro, dia do assassinato de Anna Politkovskaia?)”, a jornalista está convencida de que o investigador sabe a resposta a estas duas perguntas e que dessas se pode deduzir o nome de quem encomendou o crime com uma probabilidade de 100%.
As investigações não foram até ao fim porquê? Na entrevista que foi dada no dia do veredicto, a advogada Karina Moskalenko, não se mostrou condescendente para com o trabalho dos investigadores, porque estes não se queixaram de que lhes estavam a barrar o caminho. Qual é o sentido de levar uma investigação incompleta a tribunal? Talvez a esperança de que perante o juiz as coisas se esclareçam. Neste caso não foi assim, e agora há que voltar ao princípio, mas talvez sabendo mais coisas do que se sabia antes do caso ter chegado a tribunal.
Os jurados assim decidiram, por unanimidade, que todos os acusados no caso do assassínio de Anna Politkovskaia estão inocentes ou, pelo menos, a sua culpa não foi demonstrada na aula do tribunal. Os irmãos Ibraguim e Djabrail Makhmudov, o ex-agente da polícia Serguei Khadjikurbanov e agente do Serviço Federal de Segurança, Pavel Riaguzov, foram postos em liberdade directamente na sala do tribunal.
Enquanto esperávamos pela conferência de Imprensa da parte lesada, ou seja, os filhos de Anna Politkovskaia, Ilia e Vera, os respectivos advogados, Karina Moskalenko e Anna Stavitskaia, assim como o chefe de redacção da “Novaia Gazeta”, Serguei Sokolov, fomos trocando impressões com os colegas. Ao meu lado estava uma jornalista da “Gazeta.ru” que seguiu o processo quase todo. Na sua opinião a acusação conseguiu apresentou poucas provas. Havia grandes dúvidas sobre quem eram os homens que aparecem no video de vigilância que teria filmado o assassino, as listas de telefonemas dos acusados foram modificadas mais do que uma vez, etc. “Se estivesse no lugar dos jurados o que teria decidido”, perguntei. Ela pensa, “se calhar teria considerado não provada a culpa”. Na sua opinião os representantes da Procuradoria não estão habituados a trabalhar com o colégio de jurados, e enquanto os juízes em geral aceitam tudo o que os procuradores lhes dizem os jurados são mais desconfiados e têm que ser convencidos.
(na fotografia: Vera Politkovskaia, Ilia Politkovski e Karina Moskalenko)
Foi mais ou menos nesses termos que se pronunciou a advogada Karina Moskalenko. Declarando que o processo tinha sido leal, que a defesa tinha trabalhado de forma mais eficaz. Nada de atribuir culpas aos jurados, nada de fazer acusações contra os réus. Foram absolvidos é tudo. Os representantes da Procuradoria e os investigadores deixaram o trabalho a meio. O chefe da redacção da Novaia Gazeta, Serguei Sokolov, foi mais directo alegando que não era jurista e podia dizer o que pensava. Pensa que os acusados tiveram ligação ao caso, mas não eram os principais intervenientes. Os investigadores tiveram de enfrentar imensas dificuldades quando no processo começaram a aparecer nomes de pessoas ligadas à polícia e ao FSB (Khadjikurbanov fora agente da polícia, e Riaguzov era do FSB). Na opinião de Sokolov os investigadores fizeram o que era possível. Já Karina Moskalenko era da opinião que não há que defender os investigadores, dado que eles não se lamentaram de que não lhes davam condições de trabalho, e não deixaram que a parte lesada pudesse ter acesso ao processo, na fase de investigação. A advogada criticou o facto de que os investigadores não verificaram todas as versões, nomeadamente Ramzan Kadirov que teria afirmado saber quem é que estava pro detrás do crime, não foi interrogado pela Procuradoria. Sokolov lembrou ainda as fugas de informação que se verificaram em várias fases do processo e que permitiram ao principal suspeito da execução do crime, Rustam Makhmudov, irmão de Ibraguim e Djabrail, de se pôr a salvo no estrangeiro, com passaporte falso. Na opinião do jornalista o caso foi para tribunal antes do tempo sem que as investigações estivessem devidamente fundamentadas. Quanto ao envolvimento dos réus no assassínio de Anna Politkovskaia, Sokolov está convencido que eles são cúmplices, e afirmou que teme pelas pessoas que testemunharam no processo.
Tanto as advogadas como os filhos de Anna Politkovskaia, não se mostraram demasiado desiludidos com o resultado. Karina Moskalenko disse mesmo que pode ser uma situação mais vantajosa do que se alguns apanhassem uma pena qualquer, dado que isso poderia servir de desculpa à Procuradoria, alegando um resultado parcial. O resultado zero permite exigir que se retome as investigações.
(Serguei Sokolov)
Quanto à questão dos jurados posso acrescentar uma coisa. Anna Politkovakaia era decididamente a favor da existência de tribunais de jurados. Em 2004, no final de uma entrevista, falámos do caso do capitão Ulman, cujo julgamento (um deles, porque o caso acabou por voltar a tribunal) um dos primeiros na Rússia com jurados, tinha absolvido Ulman e outros militares, que eram acusados de terem morto e incendiado os corpos dentro do automóvel em que seguiam, cinco civis na Chechénia. Que eles tivessem cometido o delito não havia dúvidas, mas os jurados alegaram que eles eram militares e que cumpriam ordens, portanto não lhes podia ser imputada a culpa. Anna Politkovakaia, mesmo se admitia que “o nosso povo é assim”, e defende os seus (soldados russos) contra os outros (chechenos), continuava a defender que de qualquer maneira é preciso insistir no tribunal de jurados.
O treinador do Zenit de S. Petersburgo, Dick Advokat, afirmou ontem que, depois da ida de Andrei Archavin para o clube inglês Arsenal, o novo líder da equipa é o português Danny. “Em Danny vemos a substituição de Archavin, mesmo se eles são muito diferentes no que respeita a posição no jogo”, afirmou o treinador. Danny não é um puro avançado, mas ele tem outros aspectos fortes. “Agrada-me em Danny o facto de que as suas acções não se podem prever, isso é uma coisa que eu sempre valorizei num futebolista”.
Provavelmente amanhã saberemos o que decidiram os jurados, chamados a pronunciar-se no caso do assassínio de Anna Politkovskaia. Nos últimos dias falou a acusação, falou a defesa e por último pronunciaram-se os réus. Estes continuam a garantir que não fizeram nada e que estão absolutamente inocentes. A versão final apresentada pela acusação coincide em muitos aspectos com uma versão apresentada pela jornalista Iúlia Latinina à qual me referi há algum tempo atrás. Segundo os procuradores, a encomenda do crime foi feita a um certo Lom-Ali Gaitukaev, por volta de Junho ou Julho de 2006 (recorde-se que o assassínio de Politkovskaia se deu a 7 de Outubro desse ano). Mas Gaitukaev foi preso em Agosto desse ano e teria transmitido o encargo a um ex-elemento da polícia Serguei Khadjikurbanov, que é um dos réus. Khadjikurbanov é acusado de ter sido o organizador do crime, de ter comprado a arma do delito e distribuído as tarefas. Gaitukaev é tio dos outros dois réus do homicídio, que são Ibraguim e Djabrail Makhmudov, acusados de cumplicidade e de terem acompanhado o autor dos disparos ao local do crime. O “killer” teria sido um terceiro irmão Makhmudov, de nome Rustam. Gaitukaev figura no caso como simples testemunha.
A versão de Iúlia Latinina tem outros elementos. Recordo aqui o que já tinha referido há algum tempo atrás a propósito do artigo de Latinina.
A cadeia de intervenientes apontada por Iulia Latinina é a seguinte. Como personagem central na organização poderá estar Lom-Ali Gaitukaiev, uma “autoridade” do crime organizado russo, ligado a um grupo da assim chamada “mafia chechena”, o grupo de Lazania (nome do restaurante onde se reuniam). Ao que parece cabia a ele organizar as coisas. Mas Gaitukaiev foi preso no verão de 2006, por tentativa de homicídio de um “businessman” ucraniano, e apanhou 15 anos de cadeia. Gaitukaiev é tio dos irmãos Makhmudov, dos quais dois estão presos, como suspeitos no caso Politkovskaia, e um terceiro, que anda a monte, é o suspeito principal de ser o executor do crime. À falta de Gaitukaiev, recorreram ao contacto de Chamil Buraiev, como elemento de ligação com os Makhmudov, e daí os telefonemas do oficial do FSB, Pavel Riaguzov, que supostamente terá fornecido a morada de Politkovskaia, obtida nos ficheiros do FSB.
Iulia Latinina liga outro acontecimento, ocorrido no princípio deste ano, ao caso Politkovskaia. Foi raptado, em Janeiro, Movlad Altangueriev, considerado a autoridade máxima da “mafia chechena”, ligado também ao grupo de Lazania. Altangueriev, velho amigo de Gaitukaiev, segundo a jornalista, é “uma das mais prováveis candidaturas a intermediário da encomenda (do crime)”
Um dos argumentos da acusação é que, das listas detalhadas de telefonemas, resulta que os irmãos Makhmudov estiveram perto da casa de Anna Politkovskaia no dia do crime e falaram entre si. No tribunal declararam que não se recordam do que é que estavam a fazer perto da casa da jornalista no dia em que esta foi morta.
Nas últimas intervenções da acusação, as duas procuradoras (Vera Pachkovskaia e Iúlia Safina), chamaram a atenção para algumas das contradições da defesa, entre estas as referências às imagens, gravadas em video, do assassino. Gaitukaev afirmou que não podia ser o seu sobrinho Rustam, porque este é bastante mais baixo. Os irmãos tinham afirmado que não podia ser Rustam, porque este é mais alto e mais forte. Quase no fim do processo, a defesa e os parentes “de repente lembraram-se” que Rustam Makhmudov coxeia e o homem que aparece no video não...
Veremos o que vão dizer os jurados amanhã.
Os noticiários de hoje voltaram a falar do Afeganistão. O balanço em Cabul foi de 19 mortos e cerca de 50 feridos, nos ataques com realizados a dois Ministérios com bombistas suicidas. Morreram também 8 guerrilheiros. Em Moscovo era o aniversário da retirada da tropas soviéticas daquele país e o Afeganistão esteve em debate. Entre os pontos salientes, os erros dos estrangeiros no Afeganistão, as medidas indispensáveis, o diálogo com os talibãs, e as eleições presidenciais previstas para este verão.
Ruslan Auchev, general, veterano do Afeganistão e presidente da Inguchétia durante vários anos, considera que os erros que os soviéticos cometeram estão a ser repetidos. “Ao introduzir um contingente militar nós cometemos outro erro: iniciámos acções de combate a pedido dos governantes do Afeganistão. O resultado foi que o povo que tinha estima por nós, pouco a pouco, por causa das nossas acções militares, artilharia, aviação, acções das forças terrestres, com o passar dos dias cada vez mais se afastava de nós, e tornámo-nos num inimigo. Quando chegámos à retirada das tropas, a maior parte da população tinha-nos virado as costas e só uma pequena parte dos governantes e militares ainda mantinha algum respeito por nós”.
Auchev faz notar ainda que o objectivo da entrada das tropas soviéticas era fazer um Afeganistão à imagem da URSS. “Queríamos construir o Afeganistão soviético. A forma de vida soviética era o que queríamos impor ao Afeganistão. E adianta que “ a actual coligação está a fazer a mesma coisa. Tenta impor uma sua visão do Afeganistão ”. Do ponto de vista do general, o que seria preciso fazer “é conquistar a mente e o coração do povo afegão. E também a barriga, porque hoje o povo do Afeganistão não ganhou nada. Como viviam pobremente, assim continuam, como havia corrupção, assim continua, tal como haviam ricos assim continuam... Como havia tráfico de narcóticos, assim continua. O Afeganistão não se tornou num país, é um território dividido, com governantes que não têm influência nas províncias”.Auchev diz que um elemento novo, relativamente à situação que enfrentaram os soviéticos, é a presença dos talibãs. “Esta é uma nova força que tem uma grande influência. Do ponto de vista do armamento são fracos mas do ponto de vista da ideologia é muito forte. Contra uma ideia pode-se combater só com outra ideia”.
No debate que se realizou da agência de informação “Novosti”, participaram vários especialistas entre os quais Viktor Korgun, histórico, director do sector do Afeganistão do Instituto Oriental da Academia das Ciências da Rússia. Uma das questões que Korgun abordou é a insuficiência de procurar uma solução por meios militares. “A estratégia dos EUA de aumentar os efectivos militares, eu considero correcta. Mas só em parte. Resolver o problema afegão não é possível só com meios militares, isso mostra a experiência mundial de resolução de conflitos locais. Ao lado da via militar é preciso procurar vias alternativas”. Segundo o professor “ Ao lado da via militar é preciso procurar vias alternativas. Em primeiro lugar é o desenvolvimento da economia afegã”. Korgun admite que se tem mandado muito dinheiro para o Afeganistão, “ mas a maior parte desse dinheiro não é gasto de acordo com o fim a que tinha sido destinado. Vai parar a diversas bolsas e diversos bolsos e ao povo afegão chega no máximo um quinto do que foi destinado à reconstrução”. Outra questão que Korgun considera deficiente é a situação das forças armadas afegãs. “As forças armadas que se criaram no Afeganistão não estão à altura das tarefas que lhe competem, da liquidação do terrorismo no Afeganistão. O exército é fraco e pobre, os EUA recusam-se a fornecer-lhes armas pesadas, e eles combatem com velho armamento soviético. A polícia é completamente corrupta. Muitos têm mais medo da própria polícia do que dos talibãs”. Enfim a questão dos talibãs, segundo alguns força política com a qual se deve dialogar, segundo outros, uma organização terrorista, simplesmente a combater. “No que diz respeito aos talibãs, é preciso entrar pela via do diálogo. Não há outra saída, é preciso encontrar maneira de entrar em contacto com os talibãs. O movimento talibã é uma coisa muito fragmentada, amorfa, não é um partido político. É uma organização, um grupo, mas é mais um conglomerado de diversas forças políticas, onde há grupos de bandidos e criminosos, barões da droga, o partido islâmico do Afeganistão, é um movimento muito fragmentado, mas há la forças com as quais se pode entrar em diálogo”.
Quanto ao significado dos ataques de hoje, Korgun considera que esses podem representar uma intensificação da actividade bélica dos talibãs em face à política da nova administração norte-americana. “Eu penso que as explosões de hoje em dois Ministérios em Cabul, fazem parte da estratégia comum do movimento Talibã dos últimos tempos, que alarga a escala das acções de guerra, e também com a chegada ao poder da nova administração norte-americana, que falou em mudar a estratégia da luta contra o terrorismo no Afeganistão. Já hoje 2,5 mil soldados americanos foram deslocados para o Afeganistão... Estas explosões e a intensificação das acções de guerra dos talibãs são uma resposta directa à nova estratégia que ainda não existe mas que já se está a iniciar”.
De qualquer forma, o Afeganistão é um caso suficientemente bicudo para exigir os esforços conjuntos de todos os que conhecem alguma coisa do que por lá se passou e se passa agora.
Devo dizer que foi um prazer assistir ao concerto, na sala da Galeria de Arte Glazunov, da Orquestra de Câmara "Kremlin", do maestro Misha Rakhlevski, em que se apresentou como solista de fagote Rui Lopes.
Devo admitir que era a primeira vez que assistia a um concerto em que o fagote tem a função principal, e o resultado excedeu as espectativas possíveis.
Veremos o que dizem a crítica e os especialistas. Por aqui ficam umas fotografias do serão.
Uma breve reflexão sobre as “divergências” que vieram à tona na conferência de Imprensa de Vladimir Putin e de Durão Barroso, depois do encontro da delegação da Comissão Europeia com o governo russo. As coisas aqueceram quando Durão Barroso resolveu que devia dizer, publicamente, que tinha zelado pelos interesses da opinião pública europeia, e que no encontro com o presidente Dmitri Medvedev, tinha levantado a questão das preocupações relacionadas com o Estado de direito (“rule of de law”) na Rússia. Putin não gostou nem do tema, nem do facto de que este fosse levantado fora do contexto, dado que não era assunto que tivesse sido tratado no encontro entre a CE e o governo russo. Da “troca de bolas” que daí resultou, já se falou bastante. Mas há a questão em si, do Estado de direito na Rússia. Não sei se Durão Barroso se referia especialmente aos assassínios do advogado Stanislav Markelov e da jornalista Anastasia Baburova. O caso tem que ver certamente com direitos humanos, visto que Markelov se dedicava a uma série de casos difíceis, defendendo direitos dos que não têm acesso ao poder. No entanto, não creio que a elite política tenha culpas directas neste caso. Há outros mais aberrantes, como o do director do jornal electrónico “Ingushetia.ru”, Magomed Evloev, cujo assassínio tem fortes indícios de partir de pessoas que faziam parte do governo da república da Inguchétia e, apesar de a mudança do presidente daquela república ter dado esperanças de que iria ser feita uma investigação séria, agora parece ter caído no silêncio. Mas para além destes casos em que as autoridades federais russas têm a culpa de não reagir da forma de forma adequada, ou de não demonstrarem vontade suficiente para desvendar o que se passou e castigar os culpados, há outros que dependem directamente das autoridades. Na minha opinião deve-se prestar atenção a alguns dos processos relacionados com o caso Yukos, como o caso de Svetlana Bakhmina e de Valeri Alexanian. Há uma outra série de casos que põem em causa o Estado de direito na Rússia, como os casos de “espionagem” ou de “traição” (por terem revelado segredos de estado) contra cientistas. Os casos de Igor Rechetin, Igor Sutiaguin, Valentin Danilov, envolvidos em colaborações abertas e oficializadas com instituições estrangeiras, e que foram acusados de vender segredos de estado, são alguns dos exemplos de pouca transparência no sistema jurídico da Rússia. Cito aqui uma parte de uma entrevista a Ludmila Alexeeva, presidente da Federação de Helsínquia para os direitos humanos, há cerca de um ano e meio:
Entre nós o tribunal não é independente, e durante os tempos soviéticos não era independente, era completamente dependente das autoridades. Na Constituição está escrito que é independente, tentaram fazer uma reforma dos tribunais, nesse sentido, de forma a que o tribunal adquirisse independência. Houve alguns passos nesse sentido, mas em seguida, nos tempos de Putin, a pouco e pouco, o tribunal ficou novamente na total dependência do estado. Se a questão é entre cidadãos, e se de um lado e do outro não estão os interesses de uma instituição estatal, ou de um alto funcionário influente, ou simplesmente de uma pessoa rica, então pode-se esperar que se chegue a uma solução do problema de acordo com a lei. Mas se estão envolvidos interesses do Estado, ou de uma pessoa rica, não se pode esperar no triunfo da lei, a decisão vai ser a favor do estado ou da pessoa rica. Eu tenho visto histórias absolutamente trágicas. Na Rússia um em cada três reclusos ou não é culpado de todo, ou cometeu qualquer asneira e em lugar disso acusam-no de um crime grave, e dão-lhe uma pena pesada. Temos mais de um milhão de presos não porque sejamos um povo criminoso mas porque temos esta justiça. Se tivéssemos tribunais normais e um código penal normal posso garantir que podíamos ter cinco vezes menos reclusos. O mais pequeno crime supõe privação da liberdade. Não há multas nem outras medidas de castigo.
E uma parte de uma entre vista a Alexei Venediktov, chefe de redacção da rádio “Ecos de Moscovo”:
...a prática mostra que os casos em tribunal do Poder contra os jornalistas, das autoridades contra os jornalistas, dos governadores contra os jornalistas, dos presidentes da câmara contra os jornalistas, dos deputados contra os jornalistas, em quase 95% dos casos, levam à derrota dos jornalistas. Isto não é só porque aqui os jornalistas trabalham mal, é a prática jurídica que assumiu uma atitude negativa em relação à liberdade de imprensa. No entanto, todos os casos que os jornalistas levam ao Tribunal Europeu, vencem, todos, 100%. Parece-me que houve 8 casos de jornalistas, durante estes 8 anos, 7 ou 8 casos, e todos ganharam, enquanto que na Rússia perderam.
Com isto quero dizer que Durão Barroso tem razão quando levanta a questão do Estado de direito na Rússia. Há de facto muitas sombras. Outra questão é saber se simplesmente levantar as questões dá algum resultado. Os acontecimentos do ano passado mostraram que as reacções da actual classe dirigente russa se tornam mais agressivas e menos adequadas quando se encontram sobre forte pressão internacional (Ossétia do Sul) e a consequência foi um certo isolamento e um endurecimento das posições. Se se pretende defender os direitos humanos é preciso chegar a resultados, e não se ficar pelas declarações. Será que de facto se pode abrir um diálogo entre a UE e a Rússia sobre esta temática, como foi declarado (de forma diferente) por ambas as partes durante a conferência de Imprensa de sexta-feira?
Algumas ideias depois da entronização do Patriarca.
À mó de parêntesis, quando se assiste à liturgia de entronização no “quadrado” reservado à Imprensa, as impressões sobre o que se está a passar misturam-se com a luta por conseguir um espaço para ver alguma coisa (ou para fotografar), entre as pernas, braços e câmaras, dos fotógrafos e operadores das inúmeras televisões, que, com as suas escadinhas, constroem uma parede, entre nós e os acontecimentos.
Para além da solenidade e da pompa, que a cerimónia teve, a sublinhar que a entronização de um patriarca é um acontecimento para o mundo inteiro, e que, entre as Igrejas de bizantinas, a Igreja Ortodoxa Russa é a maior, eu diria que alguns elementos podiam ser percebidos como uma mensagem expressa pelas circunstâncias e imagens.
Talvez o que mais saltava à vista, era a ligação da Igreja e do Estado. Kirill na sua homilia final, sublinhou que as relações entre a Igreja e o Estado se devem desenvolver “numa base constitucional” e ao “serviço do bem da Igreja e para bem do povo”.
No entanto, a cerimónia sublinhava a importância da ligação com as autoridades. O presidente Dmitri Medevedev (com a esposa) e o primeiro-ministro Vladimir Putin (sem esposa) ocupavam um lugar de grande destaque. Além dos cumprimentos oficiais, Medvedev e Putin foram convidados a entrar junto ao altar, para além da iconóstase, onde normalmente só têm acesso os sacerdotes, por duas vezes. A agitação dos fotógrafos era maior quando se movimentava alguma coisa no “balcão” onde estavam estas as altas personalidades civis, do que quando se abriam as portas principais da iconóstase e o novo Patriarca aparecia para dar mais uma bênção ao povo.
A presença de responsáveis de outras Igrejas era reduzida. Não sei se é de regra ser assim, mas enquanto no funeral de Alexis II, esteve o patriarca Bartolomeu I, de Constantinopla, o patriarca Ilia II, da Geórgia, etc., etc. Desta vez esteve (só) o patriarca de Alexandria, Teodoro, e os chefes (metropolitas) das Igrejas Ortodoxas da Polónia e da Checoslováquia (a Igreja Ortodoxa é ainda dos dois países). As outras igrejas fizeram-se representar a um nível mais baixo...
Pareceu-me ainda que uma importância especial era dada ao tema da unidade da Igreja Ortodoxa Russa (IOR), tendo em conta que uma boa parte desta se encontra nos países que se tornaram independentes com a desintegração da URSS. A Ucrânia corresponde a mais de um terço dos fiéis da IOR. Esta atenção da a entender que Kirill vai fazer de tudo para manter a Igreja da Ucrânia ligada a Moscovo, o que, nos tempos que correm pode não ser tarefa fácil.
Da homilia do patriarca Kirill, vinha em relevo o diálogo entre as Igrejas Ortodoxas, para fortalecer a unidade. Não havia nenhuma referência ao ecumenismo, nem em relação à Igreja Católica, nem a outras, apesar da representação, relativamente numerosa de várias estruturas da Igreja Católica. Uma boa parte dos sectores mais conservadores da IOR, considera o ecumenismo um fenómeno negativo.
O Patriarca sublinhou, como “um sinal de Deus”, que a entronização se realizava no dia de S. Marcos Éfeso, o bispo que se recusou a assinar o acto de união entre a Igreja de Roma e a de Constantinopla, no concílio de Florença (1439). Segundo Kirill, S. Marcos (santo da Igreja Ortodoxa, naturalmente) foi um corajoso defensor da fé ortodoxa.