Em finais de Agosto (29), na sua residência em Sochi, Vladimir Putin recebeu os representantes de alguns órgãos da comunicação social da Rússia, entre os quais o chefe de redacção da rádio “Ecos de Moscovo”, Alexei Venediktov. “Ecos de Moscovo” (EdM) é considerada um dos poucos baluartes que ficaram da informação livre. De acordo com o que foi referido por alguns dos presentes, Venediktov foi “chamado à pedra”. Putin mostrou-lhe a gravação de extractos de reportagens feitas durante a guerra na Geórgia. “Você vai ter que responder por isto”, ter-lhe-ia dito Putin. Segundo informações da Imprensa russa e não só, já houve algumas medidas de “segurança” na EdM, para evitar críticas ao governo que ultrapassem os limites da tolerância. Na opinião de várias pessoas ligadas à informação, a guerra da Geórgia vai trazer um novo aperto na pressão que se mantém sobre os órgãos de comunicação.
A propósito da liberdade de expressão na Rússia, durante os dois mandatos de Putin, deixo aqui alguns extractos duma entrevista que fiz a Alexei Venediktov há cerca de um ano.
“...Eu penso que uma das causas principais pela qual a EdM continua a existir é que, ao contrário da televisão, nós não somos uma ameaça eleitoral para Putin, e Putin percebe isso bem. Nós não somos uma estação da oposição, somos uma estação da informação. Não fazemos guerras de informação, não apoiamos nenhum partido nas eleições, nem os de esquerda, nem os de direita, nem os do centro. Somos uma estação de informação e Putin sabe bem isso. Nós não podemos influenciar a massa dos eleitores, temos como ouvintes, em toda a Rússia, cerca de 2,5 milhões todos os dias. Não são assim tantos em comparação com cem milhões de eleitores, não somos uma ameaça. Em terceiro lugar, nos nossos estatutos está escrito de maneira muito clara que pela política da redacção responde só o redactor chefe. Por isso eu só o único ponto onde se pode fazer pressão. Nem os accionistas, nem o conselho de directores, nem o director geral, só o redactor chefe. É assim que está escrito nos estatutos. Como os jornalistas da EdM têm um pacote de acções que é suficiente para bloquear, e a Gasprom não pode alterar os estatutos sem o nosso acordo – eles têm 66% e nós 34% - para mudar os estatutos são necessários 75%...”
“... Por isso, alterar os estatutos não se pode, e por isso o único ponto de pressão sou eu. Não se pode obrigar os jornalistas a fazerem uma coisa qualquer, porque sempre que alguém telefone a querer qualquer coisa a resposta é “telefone ao redactor chefe”. Mas os meus telefones funcionam mal... As ligações são péssimas... E ainda outra coisa. Sem dúvida, nós somos a montra para o Ocidente, para a opinião pública ocidental, para mostrar que na Rússia existe liberdade de expressão. E eu sei que, sempre que apresentam queixas a Putin, da parte dos parceiros da Europa ocidental, da UE e dos americanos, ele cita a EdM, “todos vocês passam pela EdM”, que me criticam livremente, etc. Deste ponto de vista ainda somos cómodos. Portanto, há um complexo de causas.
“Por isso quando vêm alguns parceiros de Putin, nós temos sempre prioridade para as entrevistas. Se vem a Condoleezza Rice, o primeiro-ministro da GB, ou Barroso, a EdM é sempre a nº 1. Há uma piada que me contou Jacques Chirac. Antes quando se vinha à União Soviética, havia sempre 3 pontos onde tinham que ir os altos convidados: o Kremlin, o Mausoléu, e o Bolchoi. ‘Agora no lugar do Mausoléu estão vocês. Kremlin, EdM e Bolchoi’.”
Na Rússia a bolsa continua a dar fortes sinais de crise. Depois de uma pequena subida nas bolsas ao princípio da manhã, seguiu-se uma queda foi mais abrupta do que ontem. Como se vê do índice RTSI, ao meio-dia tiveram que suspender as transacções para evitar a catástrofe. Os dois sistemas de transação de Moscovo, MMVB e RTS, encerraram precisamente às 12.10 (sempre hora de Moscovo, mais três do que Portugal). Mas o ministro das Finanças continua a dizer que não há razões para alarmes. “As medidas que tomámos deverão amortecer a mudanças de choque”, afirmou Alexei Kudrin, que acha que “o sistema bancário se vai adaptar a um novo custo dos recursos, outras exigências, a uma certa diminuição de meios no mercado, à impossibilidade de poder continuar a receber crédito do estrangeiro na medida que era antes e terá de reorganizar-se no que respeita aos seus planos de crédito”. O ministro admite que essa reorganização vai exigir tempo. O ministro afirma que não se vão criar situações de “não pagamento” e que o estado “garante os depósitos bancários dos cidadãos”. O estado vai assegurar 33 mil milhões de dólares aos bancos para melhorar a liquidez do mercado que, como admitiu o ministro, “no momento presente é insuficiente para alguns bancos”. Das palavras de Kudrin percebe-se que o estado vai dar dinheiro ao Sberbank (equivalente à CGD) ao banco VTB, e ao Gazprom bank. O Sberbank continua a ser um dos mais “castigados” pela crise, e as suas acçõe voltaram a cair nas duas bolsas 21,5% (RTS) e 26% (MMVB).Um banco russo, o “KIT Finance”, parece já estar em grande dificuldade. Não pode manter os compromisso de REPO (de repurchase agreement - emissão de obrigações com compromisso de comprar novamente), e informou que está em negociações com um investidor.
Entretanto o director do Banco Mundial, Klaus Roland, afirmou que a Rússia estava bem preparada para enfrentar a crise e que nos tempos “próximos” a coisa se vai resolver. “Dentro de alguns meses, analisando os acontecimentos de agosto-setembro, e graças a medidas tomadas com bom senso, todos os problemas vão ser resolvidos”. Valha-nos o optimismo...